Quando a Francisca fez seis meses, apesar de saber
que não era minha intenção colocá-la antes de um ano de idade no infantário,
comecei a pesar as minhas opções.
Percebi que, em breve, ela ganharia mobilidade e o
meu trabalho de “stay at home mommy” ia ficar mais complicado, compreendi que
trabalhar numa dissertação com uma criança e uma casa aos nossos cuidados era empreitada
mais trabalhosa do que havia previsto, acima de tudo, pressenti que as suas
necessidades de interacção com outras crianças iam aumentar, e que ela
necessitaria de estímulos que a opção “continuar em casa com a mãe”, na minha
opinião, ia deixar de satisfazer inteiramente. Também devo confessar que comecei
a sentir necessidade do meu espaço, aparte do dela, até porque o meu marido
trabalha numa consultora e os horários dele sempre foram complicados e
imprevisíveis.
Havia chegado a altura de pesar as minhas opções e
enfrentar o fantasma da separação... Confesso que não foi nada fácil! A ideia
de me separar dela, quando ia continuar em casa, embora estivesse a trabalhar
na dissertação (cujos prazos começavam a tornar-se dolorosamente reais),
pesava-me na consciência (a maldita culpa), mas, com uma boa dose de diálogo,
interno e externo, apercebi-me que seria melhor, para ambas, lidarmos com o
inevitável: a separação. Coloquei três hipóteses:
1) Deixá-la aos cuidados da empregada - ainda
tentei, mas não conseguia relaxar o suficiente quando estava fora de casa (a
pessoa em causa não me inspirava confiança suficiente e, passada uma semana, começou
a pedir-me 1h30 de almoço, o que, a longo prazo, ia tornar-se impraticável; ademais,
estava a assistir a casos na família, e fora dela, em que a pessoa que estava a
tomar conta da criança, pura e simplesmente, mudava de emprego, sem apelo nem
agravo, e achei que isso teria consequências desastrosas).
2) Deixá-la aos cuidados de familiares - contudo,
os meus pais trabalham e os meus sogros (que são socialmente mais activos do que eu e o meu
marido, juntos) não se quiseram comprometer a ficar com ela todos os dias, durante
as horas normais de um infantário (das 9h às 17h); ademais, a questão da interacção com
outras crianças, e a necessidade de outros estímulos (nomeadamente, aulas de
locomoção e de expressão musical com pessoas especializadas), mantinha-se.
3) Ir para um infantário - acabou por ser a opção
que me pareceu mais adequada.
Face a esta decisão, arregacei as mangas e fiz uma
pesquisa, exaustiva, dos infantários da minha área de residência e arredores.
Munida, como a típica “control freak” que sou, do meu questionário, que
consistia nas seguintes questões:
- O limite de bebés, por sala, é respeitado?
- Qual é a rotina dos bebés da idade da Francisca,
e como é que ela se altera conforme a idade?
- Existe uma auxiliar e uma educadora por sala (ou
duas auxiliares, no caso do berçário)? Isto é, o número de funcionários por
criança é respeitado?
- O pessoal está sempre a rodar, ou existe a
preocupação em manter alguma consistência/estabilidade?
- Habilitações e experiência profissional do
pessoal?
- Há uma enfermeira, ou alguém na creche que saiba
prestar primeiros socorros, caso seja necessário?
- Os bebés mais crescidos têm acesso à Francisca?
Quando e em que situações? Estas interacções são supervisionadas? Se sim, por
quem?
- Existem espaços ao ar livre? Se sim, quando é que
a Francisca tem acesso aos mesmos e com quem?
- Há uma copa separada para o berçário?
- Outros itens: higiene (chão, sapatos, brinquedos,
fraldário e casas de banho, refeitório); iluminação; ruído; segurança;
estacionamento; cópia dos regulamentos; projecto educativo.
- Reacção à Francisca (Pararam para falar com ela?
Teceram-lhe elogios e deram-lhe miminhos?).
- Reacção aos pais (Sentimo-nos acolhidos, compreendidos,
ou despachados?).
- Cuidado e disposição das crianças do infantário
em causa.
- Condições de pagamentos e gastos adicionais
(mensalidade, prolongamento, e outros custos, tais como fraldas, toalhitas,
alimentação).
- Posso visitar a Francisca quando quiser? Tenho
liberdade para vir buscá-la na hora que me for mais conveniente?
- Tenho referências da creche em questão (pessoas
conhecidas que já lá tenham os bebés e que estejam satisfeitas com os cuidados
prestados)?
Depois de muita pesquisa, muitas desilusões, e
alguns choques (visitei infantários em que os bebés eram deixados horas
seguidas nas espreguiçadeiras, muitas delas eléctricas), lá encontrei uma
creche à nossa medida, com a qual continuo encantada. Acabou por ser a
qualidade do pessoal e das relações humanas que me conquistou, e não o espaço
físico (embora as condições de segurança e higiene sejam religiosamente
cumpridas, não possui, por exemplo, espaço exterior). Foi a forma como fomos
recebidos e acarinhados que me conquistou, além da organização (afixação da
ementa semanal e das actividades semanais, presença de uma rotina fixa para as
crianças, possibilidade de fazer uma iniciação gradual, flexível, em que a
minha presença, mais do que tolerada, foi bem-vinda). Com o tempo, a
preocupação diminuiu, a ansiedade dissipou-se, e, eu fui vendo a minha piolha
desabrochar, cada vez mais, na interacção com o pessoal e os amigos, que ela
tanto adora. Hoje em dia, pergunta pela escola e pelos amigos quando se
ausenta, é uma criança segura de si, confiante, que aprendeu a estar separada
dos pais e eu não podia estar mais contente por ter tomado aquela decisão que
me foi tão penosa...